Delegado Ruy nunca fez publicidade das ameaças que recebeu, diz Doria que o nomeu chefe da Polícia Civil
16/09/2025
(Foto: Reprodução) Doria fala sobre morte de ex-delegado geral Ruy Ferraz Fontes
Bervelin Albuquerque/g1
O ex-governador de São Paulo João Doria afirmou que o ex-delegado geral Ruy Ferraz Fontes, morto a tiros nesta segunda-feira (15) em Praia Grande, litoral paulista, nunca relatou sobre receber ameaças de facções criminosas.
Ruy foi indicado por Doria e exerceu a função de delegado-geral da Polícia Civil entre 2019 e 2022.
"Ele sempre foi muito discreto, nunca reclamou e nunca relatou. Eu sabia por outras pessoas, mas dele não. Ele nunca fez publicidade disso [das ameaças] e nem se autoflagelou em função das ameaças que recebeu. Ele era tático, planejava e agia com muito cuidado e com muito senso de justiça também. Nunca via ele cometer um ato de maldade ou uma vingança", afirmou Doria durante velório de Ruy nesta terça-feira (16).
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Ainda conforme o ex-governador, ele escolheu Ruy para ser delegado-geral da Polícia Civil por ser dedicado e sério.
"Era um homem sério, dedicado, com um histórico competente. O Ministério Público também endossava muito, falava bastante bem a respeito dele, da sua postura, e ele era um estudioso. Ele analisava os fatos, não era uma pessoa agressiva, aliás não tinha nada de agressividade. Ele era intelectual do ponto de vista da gestão policial. Ele manejava, estudava e executava bem, e tinha um espírito de equipe também. Com essas informações, eu não tive dúvida que ele poderia ser indicado delegado-geral e foi exatamente o que fiz ao indicá-lo para o general João Campos, então recém-nomeado secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo", relembrou Doria.
E complementou: "Uma perda para São Paulo. Ele estava já aposentado da Polícia Civil, estava atuando como secretário da administração da Prefeitura de Praia Grande. Uma grande perda, muito triste, uma morte tão bruta, tão maldosa, um péssimo exemplo".
Dois suspeitos identificados
Primeiro suspeito do assassinato do ex-delegado Ruy Fontes foi identificado, afirma Derrite
Câmeras de segurança registraram o momento em que criminosos em um carro perseguiram seu veículo, que bateu em um ônibus. Em seguida, o grupo desceu do automóvel e atirou em Ruy (veja vídeo abaixo).
A polícia de São Paulo identificou dois suspeitos de participarem da execução, segundo o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite.
"Vamos solicitar a prisão temporária dos dois já identificados. Seguimos com todas as polícias empenhadas nesse caso, para que os culpados sejam punidos", disse Derrite em post nas redes sociais.
Segundo o secretário, os criminosos não conseguiram atear fogo em um segundo veículo utilizado no crime, um Renegade, e a Polícia Técnico-Científica conseguiu coletar material para identificação dos envolvidos.
Ruy Ferraz Fontes foi executado a tiros em Praia Grande, SP
Prefeitura de Praia Grande e Reprodução
Durante o velório do corpo do delegado Ruy, Derrite afirmou que o primeiro suspeito identificado já foi preso ao menos quatro vezes, sendo duas por tráfico de drogas e duas por roubo. Durante a adolescência, ele também foi apreendido. A identidade dele não foi divulgada.
"Todos que participaram desse atentado terrorista, porque é isso que aconteceu contra o doutor Ruy, serão punidos severamente por isso", afirmou o secretário.
Ele ainda destacou a agilidade da investigação: “Quero registrar publicamente a confiança que nós temos nas instituições do estado de São Paulo, em especial no trabalho investigativo da Polícia Civil, que em poucas horas já conseguiu identificar um dos indivíduos envolvidos nesse crime bárbaro. Assim que soubermos exatamente qual foi a participação dele, vamos relatar para vocês”.
Há pelo menos duas linhas de investigação sobre a morte do delegado Ruy.
Vingança em razão da atuação histórica de Ruy Fontes contra os chefes do PCC
Reação de criminosos contrariados pela atuação dele à frente de Secretaria de Administração da Prefeitura de Praia Grande.
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O governador Tarcísio de Freitas determinou mobilização total da polícia. “Estou estarrecido. É muita ousadia. Uma ação muito planejada, por tudo que me foi relatado”, afirmou o governador.
A SSP-SP criou uma força-tarefa integrada das polícias Civil e Militar. Ambos os departamentos contam com policiais que têm muitos informantes no crime organizado e que podem ajudar a elucidar a execução de Ruy.
Quem era Ruy Fontes
Delegado Ruy Ferraz Fontes é executado a tiros em Praia Grande, SP
O ex-delegado-geral atuou há mais de 20 anos na prisão de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, e no combate ao Primeiro Comando da Capital (PCC) no estado.
"Estou em choque, fui o último a falar com ele [por telefone]", disse ao g1 Marcio Christino, ex-promotor que atuou no combate à facção e seus chefes, no início dos anos 2000, com Ruy, que à época era delegado no Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), na capital paulista. Atualmente, Christino é procurador de Justiça.
Christino chegou a mencionar a atuação de Ruy como delegado contra o Primeiro Comando da Capital no livro "Laços de sangue: A história secreta do PCC", que escreveu com o jornalista Claudio Tognolli. Foram mais de 40 anos como policial.
O ex-delegado-geral comandou a Polícia Civil paulista entre 2019 e 2022, quando foi indicado pelo então governador João Doria, à época no PSDB.
Ele também atuou no Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Departamento Estadual de Investigações contra Narcóticos (Denarc) e no Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap).
"[Ruy] foi uma das pessoas que prendeu o Marcola ao longo da história do PCC, que esteve passo a passo nesse enfrentamento ao PCC, e ser executado dessa maneira. Isso mostra, infelizmente, o poderio do crime organizado, a falta de controle que o crime organizado tem dentro do Brasil, dentro do estado de São Paulo. É uma ação extremamente ousada", disse Rafael Alcadipani, professor da Faculdade Getulio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Formado em direito pela Faculdade de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, Ruy se tornou delegado depois e começou a investigar o PCC no início dos anos 2000.
Quando esteve no Deic, participou das prisões de alguns dos chefes da facção, incluindo Marcola, por tráfico de drogas, formação de quadrilha e outros crimes relacionados ao grupo criminoso.
Em 2006, ele e sua equipe de policiais indiciaram Marcola e a cúpula do Primeiro Comando da Capital.
Segundo Christino, ele, Ruy e todas as autoridades, sejam elas do MP ou da polícia que atuaram no combate à facção, já foram ameaçadas antes pelo PCC. "Ele [Ruy], eu e todos que trabalharam naqueles casos, inclusive nos ataques de 2006."
Em 2006, ordens do PCC de dentro das cadeias determinaram uma série de ataques contra agentes de segurança pública devido à decisão do governo paulista de transferir as lideranças da facção, incluindo Marcola, para o presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau, no interior do estado.
Infográfico: criminosos fazem tocaia antes de iniciar ataque e perseguição ao delegado
Arte/g1